quarta-feira, setembro 29, 2010

Viena de Áustria (Inverno 2010)

Wiener Mélange no Café Hawelka

Primeiras Impressões

Estou sentada no café Hawelka no centro da cidade de Viena.
A decoração é tipo arte nova, os móveis são antigos, os sofás de feltro e há fumo no ar. Os posters nas paredes anunciam exposições já muito idas, como o deste Pablo Picasso, que me sorri duma banheira, assim fazendo ainda publicidade ao seu fotógrafo David Douglas. Há quem diga e jure a pés juntos que era aqui que Kafka costumava tomar o seu cafézinho quando em Viena. Outros já não estão tão seguros, mas que ele morou nesta mesma rua, lá isso morou! Seja como for, considero isto um bom sinal.

Ontem foi um dia muito longo. Tempestades de neve, atrasos de voos, de comboios e muito, muito frio. O que me safou foram os taxis. O primeiro salvou-me logo de manhãzinha.
O nevão tinha apanhado os transportes públicos de Munique de surpresa e o caos instalou-se complacente. Receosa de perder o meu voo, decidi apanhar um táxi. É realmente surpreendente que numa terra em que a neve é um fenómeno habitual,  como em todos os Invernos, esta, mesmo assim, provoque tantas dificuldades... Não obstante, o caminho para o aeroporto foi bastante interessante. 
O taxista explicou-me certos episódios da história alemã, nomeadamente as revoluções camponesas, que pelos vistos eram bastante frequentes e se viravam tanto contra a nobreza como até mesmo contra o clero, que, como bem sabemos, eram as únicas instâncias com o poder de os explorar a qualquer nível. 
Embora estes levantamentos fossem na sua maioria esmagados pela superioridade militar dos subjugadores, há porém que admirar e até elogiar a coragem destas pessoas simples que, apesar da desigualdade eclatante, saíam à rua para lutar por uma vida melhor. A coragem merece sempre respeito. 
E como a conversa é como as cerejas, acabámos por comentar a situação política do país e do mundo, de como os políticos já não representam o povo, mas sim a indústria e os seus interesses comerciais; de como já não vivemos numa democracia como sonhada de início, mas numa ditadura partidária e de como a voz do povo deixou de ter valor e de ser decisiva. Infelizmente, o meu interlocutor deixou-se entusiasmar e acabou num monólogo negativista obsessivo e muito cansativo. Afinal eram ainda 7 da manhã!

Durante o resto da viagem o meu estado de espírito encontrava-se melancólico. Não parava de pensar na minha vida e em tudo aquilo que não me agradava de momento. É claro que tudo na vida não passa duma questão de perspectiva, quanto mais negativo pensamos mais deprimidos ficamos e quanto mais deprimidos, mais negativo pensamos e por aí a fora até cem… É ao que chamam agora de "Lei da Atracção".  Se é lei não sei, mas não há dúvidas de que realmente funcionamos assim.

Mas em Viena o Sol logo veio em meu auxílio!
É verdade, nesse dia de Inverno foi o Sol o protagonista principal.
"Guiou-me" em direcção ao hotel e, mais tarde, pelas ruas da cidade. Tinha decidido só seguir pelas ruas banhadas de luz, que a neve reflectia dourada, e assim fui "guiada" até à Academia das Belas Artes e até ao Café Ritter na Maria-Hilf-Str. A sua luz trouxe cor e vida a edifícios e paisagens que até esse momento não passavam de sombras cinzentas e tristes. Lembrou-me de que nada é tao mau como parece e isso fez-me muito bem.

A Academia das Belas Artes é lindíssima! Paredes, tectos, tudo pintado em estilo dito "Renascentista". Tudo muito colorido, muito cheio, muito mesmo muito! E depois o contraste, a rebeldia, as palavras de ordem. "A Arte é uma puta!". Gostei imenso. Cheira a criatividade, cheira a vida!

Até ao Café Ritter foi uma boa caminhada, mas valeu a pena. Este café é amplo, igualmente em estilo dos anos vinte e os seus garçons são grisalhos, algo lacónicos, mas mesmo assim simpáticos. Senti-me à vontade e finalmente tive tempo para pensar e para me reencontrar entre uma Wiener Mélange e uma Sachertorte. Bem bom! Devia fazer isto mais vezes!

As minhas impressões sobre a cidade:
Pouco posso dizer sobre a sua beleza. Dias frios e cinzentos são pouco favoráveis para tal análise e também me faltou o tempo - afinal de contas estava só de passagem. Os edifícios são impressionantes, sem dúvida, mas por outro lado, não são nada que também não se encontre em qualquer outra metrópole europeia.
O que mais me chocou foi o facto das pessoas estarem mal-vestidas! Do ponto de vista estético não têm gosto nenhum! Nunca esperei que uma cidade mundialmente famosa tanto pelo seu elevado nível cultural como pela sua elegância tivesse tão pouca noção de estilo... Não faz sentido!
Evidentes são a pobreza e os conflitos sociais. O centro aparenta riqueza, mas tudo à sua volta aponta para uma discrepância gritante entre classes. Há uma certa tensão no ar. O racismo, a xenofobia e o medo não se podem esconder por detrás de boa-educação e sorrisos amarelos. O ser humano é um ser emocional, empático, intuitivo. A aversão sente-se! 
Tais impressões foram o meu tema de conversa com o taxista que me levou já de noite de volta ao hotel. Este senhor originário do Irão explicou que na Austria os estrangeiros são segregados não por leis, nem manifestações públicas, mas sim pela tal aversão latente... Ele prosseguiu dizendo que, segundo a sua experiência, o que os austríacos receiam é que a sua riqueza seja contestada. Não que seja roubada, mas que se descubra que no fundo a não merecem, principalmente quando comparados com outros igualmente capazes, que por serem estrangeiros acabam porém por ser pior remunerados e tratados como cidadões de 2a. classe.
Achei isto realmente interessante uma vez que torna evidente que a população está deveras consciente da injustiça social, humana até! Contudo, ninguém faz nada por medo de perder a cara!

Nós, seres humanos, somos realmente criaturas muito estranhas...

Mas ainda acredito!

1 comentário:

anjinhos disse...

Sinto-me tantas vezes assim, oh alma inquieta!!!
Mas chego á conclusão que é a busca incessante de qualquer coisa, que me faz sentir viva e equilibrada, temo um dia descobrir que não há um lugar ideal, porque todos aqueles em que me senti feliz naquele momento exacto, foram os melhores do mundo!!!Ou que o lugar ideal é sempre aquele onde estou, respiro e deixo a minha marca pessoal:))) Eu encontro-me agora exactamente aqui, amanhã...não sei!