sexta-feira, agosto 24, 2012

Eu e Elas e o Nosso Amigo Putin

by uka


O importante é os russos estarem bem.

"As miúdas só querem é atenção!" diz uma sobre as Pussy Riot que foram condenadas a 2 anos de trabalhos forçados na sexta-feira passada.
"Agora têm que aguentar com as consequências!" diz a outra.
"Então e a liberdade de expressão?" pergunto eu.
"Hás-de me explicar o que o vandalizar uma igreja tem a ver com liberdade de expressão..." riposta a primeira em tom desafiador.
"Vandalizar? Tanto quanto eu sei, elas só tocaram uma música!",
"Não, não! Vandalizaram ao ponto de abalarem a fé de alguns crentes!" responde ela com fervor. 

"Desculpa lá, mas que fé é essa que se deixa abalar tão facilmente? Além disso, pelo que sei aquela igreja não passa dum edifício que pode ser alugado para todo o tipo de eventos com três pisos subterrâneos de parque de estacionamento e chegou a servir de piscina pública durante o regime comunista. Não me parece ser um lugar assim tão sagrado!"
A primeira torce o nariz e por fim responde, 

"Pode ser, mas elas não tinham o direito de fazerem o que fizeram!"
"Mas tu sabes o que fizeram?" indago eu já duvidando da fidelidade das suas fontes.
"O que elas queriam era chocar a opinião pública!" afirma ela evitando a questão.
"E não achas que elas tinham alguma razão para isso?"
"As russas são bem conhecidas por quererem sempre chamar a atenção e estas não são exceção!"
"Mas tu não és russa também?"
"Sou e é por isso que eu sei! Acredita, é tudo só publicidade!"
"A mim parece-me mais uma ação de protesto político!"
"Isso é a nova moda lá da Rússia. Agora é bem dizer mal do governo!"
"É bem? Num país onde as pessoas têm cada vez menos direitos, onde já nem se podem reunir livremente..."
"Isso é só propaganda! Não acredites em tudo o que ouves nas notícias!" interrompe-me ela com desdém. Isto vindo da mesma pessoa que meia hora mais tarde afirma estar convencida de que os ovos não contêm gordura depois de ter visto um programa dum qualquer canal privado -> sem comentários...
E ela contínua,
"Quando falo com a minha família lá, eles dizem-me que isso não é bem assim!"
"Ah pois, tens razão. Numa terra de liberdades restringidas, parece-me bastante natural que falem abertamente sobre o tema... Faz sentido." não me aguento e recorro ao sarcasmo.
"Deixa-me dizer-te uma coisa, o Putin é o melhor que poderia ter acontecido à Rússia! Se não fosse ele o povo andaria ao Deus dará! Teríamos senhores da guerra locais e sabe-se lá que mais! Com o Putin o povo está bem! Tem dinheiro! Tem uma economia forte que lhe permite viver bem!" defende-se ela patrioticamente.
"Estou a ver. Isso claro que desculpa o silênciamento "misterioso" de todas as vozes que se opõem ao governo... ou a condenação à prisão e a trabalhos forçados... Não achas isso um preço demasiado elevado? A tua liberdade por um pouco de dinheiro?"
"E sem dinheiro? Que liberdade é que tens? As pessoas têm que ser metidas na ordem! Em sociedade não podem fazer o que lhes bem apetece!"
"E porque não? Desde que não prejudiquem ninguém!"
"Ora aí é que está! É como aquele oligarca, como é que ele se chama?..."
"
Khodorkovski..."
"Sim, exacto!..."
"Ele também foi preso por se ter virado contra o sistema de Putin!"
"Nada disso! Nada disso!"
"Deixa-me adivinhar... propaganda?..."
"Ele teve que ser preso porque queria vender a a sua firma de petróleo aos americanos! O petróleo não é dele! É um bem do estado e pertence ao povo russo! Não pode vendê-lo assim sem mais nem menos! Primeiro compra a plataforma por uma bagatela e agora ia vendê-la ao nossos concorrentes e ainda por cima fazendo um lucro desgraçado!
"Pensava que a Rússia se tinha rendido ao capitalismo..."
"Sim, mas não é bem assim..."
"Vamos ver uma coisa, o governo de Yeltsin vende-lhe a plataforma por uma bagatela num momento de aflição. O
Khodorkovski transforma-a num empreendimento imensamente lucrativo e logo que se opõe ao governo agora vigente é imediatamente desapropriado e metido na prisão. Desculpa lá, mas isso é despotismo!"
"Tu não entendes. O petróleo não é dele!"
"Não é? Ele comprou-o ou não comprou? Segundo as regras básicas do capitalismo o que eu compro é meu!"
"Por amor de Deus! Párem com isso!" diz a segunda que se tinha mantido à parte da discussão até este momento.
"Vamos falar de outra coisa!" diz a segunda.
"Sim, vamos falar de ovos!" digo eu

Aqui fica o vídeo de que todos falam, mas pelos vistos nem todos viram.
Os quarenta segundos que levaram a dois anos de trabalhos forçados.



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